sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Jemaa el-Fna


Dezenove dirhams, cerca de quatro reais, é quanto custa o meu café da manhã. Quatro pelo suco de laranja fresco, tomado em uma das dezenas de barracas que vendem a bebida a preço tabelado na praça Jemaa el-Fna, com direito a chorinho de quase meio copo, e quinze pelo chá de hortelã e pelo pain au chocolat, consumidos em um café. Muito barato, ainda mais levando em conta a vista privilegiada da maior praça de Marrakech, provavelmente o principal ponto turístico do Marrocos.

- Tem que pagar o chá e o croissant agora, mon ami.
- Tá aqui.

Do alto dos minaretes, os almuadens chamam quase simultaneamente à prece pela segunda vez do dia. A primeira me acordou, às seis da manhã. O belo e incompreensível canto logo cessa, e as escalas árabes das flautas dos múltiplos encantadores de cobra voltam a todo fôlego. De onde estou, conto doze deles, oito especializados em najas que permanecem indefinidamente em posição de bote, quase nunca o concluindo. O último acidente com uma serpente aconteceu já faz um tempo, mas parece que o turista nunca voltou pra reclamar.

Vejo também um sujeito perambulando com um macaco no ombro, propondo fotografias com os passantes, dois tocando percussão local, oferecendo mini shows para os dispostos a pagar, e ainda um outro com um chapéu típico do país, de formato parecido com uma lata de goiabada mais alta, do centro do qual sai uma espécie de corda trançada de cinquenta centímetros com uma bola de tecido na ponta. Este cidadão abaixa o pescoço e descreve voltas rápidas com a cabeça, fazendo a corda girar como se fosse uma hélice. Não entendi se ele propõe algo aos transeuntes ou apenas tenta refrescar as ideias nesse inverno do quase Saara, onde as temperaturas variam até trinta graus durante o dia.
                                  
Há charretes decoradas que passam procurando passageiros e turistas que encontram uma realidade totalmente diferente das suas.

Há mulheres vestindo véu completo e moças que usam jeans e camisas e cobrem apenas as cabeças.

Há pedintes estendendo a mão em árabe e comerciantes que abordam em francês, oferecendo uma promoção relâmpago, exclusiva e imperdível.

Há milhares de pedestres desavisados e dezenas de scooters e bicicletas que costuram em um balé tão caótico que quase sincronizado e então se embrenham pelas ruelas e souks.

Há todas as baixas construções circundantes da praça pintadas invariavelmente em vermelho terra e com detalhes em verde, as cores da bandeira do país, e ao fundo as altas montanhas do Atlas, no topo das quais ainda há neve.

A vida do lugar se impõe tão intensamente que decido ficar um pouco mais para vê-la desfilar diante dos meus olhos.

- Mais um chá de hortelã, min fadlak.
- Dez dirhams.
Aqui. Chokran.
- Ma haalihch, mon ami.

Chers amis, o Chéri à Paris voltou por cinco semanas, cinco textos, o tempo das minhas férias na França. Esse é o segundo deles. O próximo estará no ar na 6a feira que vem. 

3 comentários:

Cristovao disse...

Texto bacana, Sambiba! Fui eu que fiz, né?

mami disse...

Oi, interessante, Loulou curtiu?
Dá até vontade de dar uma passadinha por lá, mas está um pouco longe....
Bjs, mami

Rafael disse...

Sem dúvida a praça mais doida que já fui! Maneiro o texto, Sebba.